Imposto sobre todos os alimentos ultraprocessados

O debate sobre o “imposto sobre o pecado” no Brasil, que propõe taxar bebidas açucaradas como estratégia para melhorar a saúde pública, continua a gerar opiniões divididas. Porém, segundo a nutricionista Sandra Maria Chaves dos Santos, esta medida por si só não resolverá o problema e poderá até afetar injustamente os consumidores.

Chaves dos Santos defende que a abordagem de taxar diretamente o consumo de bebidas açucaradas pode ser interpretada como uma forma de “culpabilização das vítimas”. Num contexto em que os consumidores estão expostos ao marketing alimentar agressivo e à desinformação sobre os produtos, é injusto fazê-los pagar pelas consequências destas práticas.

Em vez disso, o especialista defende que os impostos devem ser aplicados na origem, ou seja, sobre a produção de alimentos ultraprocessados, que não se limitam às bebidas açucaradas. Segundo a Organização Pan-Americana da Saúde, é um amplo universo de 250 produtos agrupados em 21 categorias e dos quais os mais comuns são: barras energéticas, queijos, iogurtes adoçados, sorvetes, salgadinhos doces e salgados, sopas (enlatadas, instantâneas) , temperos, cereais matinais, pães e doces, biscoitos, margarinas, entre outros.

Neste sentido, o especialista destaca que tributar a produção destes alimentos não saudáveis ​​seria uma forma mais eficaz de reduzir o seu consumo e motivar a indústria a desenvolver produtos mais saudáveis. Mas, frisa, o imposto deve ser acompanhado de estratégias educativas que informem o consumidor de forma criativa e acessível. Desta forma, um impacto positivo a longo prazo poderia ser alcançado.

Chaves dos Santos alerta que a imposição de um imposto direto ao consumidor pode reduzir o consumo apenas temporariamente. A indústria rapidamente adaptaria seus produtos ou encontraria novos que não fossem tributados, perpetuando o problema. Para evitar esse ciclo, é fundamental que os impostos sejam aplicados na origem da produção e que sejam acompanhados de programas de fiscalização e de educação. Só assim, segundo o especialista, será possível gerar mudanças profundas e sustentáveis.

O especialista sustenta que sem informação adequada sobre os riscos dos alimentos ultraprocessados ​​e como fazer escolhas saudáveis, qualquer imposto corre o risco de ser visto como uma penalidade injusta que só geraria descontentamento entre os consumidores. A chave é uma abordagem abrangente que inclua tanto a educação como a regulamentação.

Um aspecto crítico que o especialista destaca é a desigualdade de acesso a alimentos saudáveis ​​no Brasil. As áreas com as maiores populações vulneráveis, aquelas com baixos rendimentos ou com problemas de insegurança alimentar, tornaram-se “desertos alimentares”. Nessas áreas predominam os produtos ultraprocessados ​​devido ao seu baixo custo e maior prazo de validade, mas oferecem pouco valor nutricional. Chaves dos Santos sublinha que a solução destes problemas deve ir além da mudança individual de hábitos; O meio ambiente também desempenha um papel crucial na promoção da alimentação desordenada.

Por último, Chaves dos Santos defende que a obesidade e o excesso de peso devem ser abordados como fenómenos de saúde pública. As políticas públicas devem concentrar-se na mudança do ambiente alimentar, ampliando o acesso a alimentos frescos e nutritivos, incluindo a produção agroecológica nas cidades e áreas próximas. Somente com esse tipo de medidas, juntamente com impostos sobre produtos ultraprocessados ​​e uma educação nutricional sólida, podem ser criadas mudanças reais e duradouras.

O “imposto sobre o pecado” não pode ser uma solução isolada. Embora os impostos sobre os alimentos ultraprocessados ​​possam reduzir o consumo, estas medidas precisam de fazer parte de um plano abrangente que inclua educação, regulamentação e maior acesso a alimentos saudáveis. Só assim poderemos evitar que sejam os consumidores, muitas vezes vítimas de um ambiente alimentar desfavorável, os que paguem as consequências.

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